01/02/2011

O punk virou instituição


           O Green Day é uma banda com horizontes que vão além do rock, mas ainda interessada na                transgressão. E no corpo a corpo - literal - com os fãs.

     Para uma banda pumk batizada com uma gíria sobre consumo desenfreado de maconha (no tal dia verde, ele é liberado), até que Green Day soube fugir muito bem da imagem de três adolescentes problemáticos sem muito o que fazer. Nenhum outro disco de Billie Joe Armstrong, Mike Dirnt e Tré Cool alcançou a marca de 18 milhões de cópias de Dookie - outra gíria besta, sinônomo de cocô. O discurso hoje é bem mais politizado e o humor um tanto mais refinado. Melhor assim. Por mais que os palcos tenham crescido ao longo destes 20 anos em em que a banda lança discos. a relação com os fãs nunca esteve tão íntima. A mulher de Billie - Adrienne Nesser, com a qual é casado desde 1994 - já chego a jogar no Google "Billie Joe Armstrong bissexual" para ver que bicho iria dar. Encontrou páginas e páginas de fotos de seu marido tascando a língua na boca de fãs durante shows.
     Mas Billie faz questão de tranquilizar Adrienne. Volta e meia, afirma que nunca esteve com uma groupie em toda a sua vida e que se alguma garota chagar a menos de um metro dele, a mulher bota pra correr na hora. Até a declaração dada á revista gay The Advocate há 16 anos, dizendo-se bissexual, foi retificada recentemente: hoje ele diz não ter certeza se de fato gosta de meninos e meninas. "Sempre existiram pessoas que não aceitaram isso, que eram homofóbicas", contextualizou em entrevista á revista americana Out. "Há diferentes cantores punk, de um cara chamado Cretin Chaos do Social Unrest a sujeitos como o Morrissey. Além de caras como Bowie ou Mike Ness do Social Distortion, que usavam maquiagem. Eu gosto de músicas que não tenha gênero especificado, como aquela do Replacements chamada 'Androgynous'."
     Bissexual ou não, é comum nos shows esses contato direto com admiradores, sejam homens, sejam mulheres. A garantia é não só de carícias mútuas, os fãs também metem a mão em instrumentos musicais. A moçada que é convidada a subir nos palcos de Iggy Pop se contenta em pular e sacolejar ao lado do lendário homem de frente dos Stooges. Nos shows do Green Day, você corre o risco de ter que cantar, dançar e tocar instrumentos. Foi assim na participação da banda no festival americano Lollapalooza, no começa do mês de agosto: mais de uma dezena de fãs foi alçada para o palco. No fim daquele show, Billie deu mais um exemplo de que a autoironia do Green Day nunca esteve tão bem calibrada: "E depois de nós , tente ficar por aí para ver o Smashing Pumpkins... Espera aí, em qual ano estamos?".

      Neste 2010 com pinta de 1995, há de ser respeitada uma banda que saiba manter a reputação intacta junto aos fãs. Ainda mais quando ela decide espalhar músicas de seus dois trabalhos mais recentes, American Idiot e 21 Century Breakdown. em espetáculo da Broadway e isso pouco interfere na imagem perante o público e no desempenho comercial: mais de 14 milhões já compraram o disco American Idiot, de 2004. Sempre vai existir alguém falando que fulano de tal traiu o movimento, sinal da qual o Green Day obviamente não escapa. Quando Billie pensa em punk, vem á tona o que define como "uma necessidade de viver algo por conta própria". "Parte do problema com o punk rock é que as pessoas acreditam que ele deveria ser só uma coisa. Tudo para mim começa de um jeito punk quando estou escrevendo canções - é quase como se eu me despisse e focasse no esqueleto da música novamente. É algo que já está no meu DNA", explica.
      Afinal, qual o sentido de permanecer sendo punk depois de duas décadas? "Nossa meta é escrever boas canções, e isso vai além do gênero", responde.  "O negócio sobre ser punk é que há puristas. Uma vez que você começa a ir fora disso, eles não acham mais que o que você está fazendo é o punk rock. Minha seleção de compositores favoritos vai de Sex Pistols até Lennon e McCartney. Então, é isso o que o Green Day é - não há regras", contou á revista Time, no fim de junho.

                           BANDA DE BAILE

      Na hora de construir o show da 21 Century Breakdown World Tour, esse raciocínio é elevado á enésima potência. A dupla dos Beatles é lembrada com trechos de "Stand By Me" e "Hey Jude", nessa ordem. Mas isso é só um aperitivo da porção banda de baile do Green Day. O trio que só tocava para os devotos do punk de garagem hoje se arrisca a rever um pouco da história do rock em medleys com pedaços de clássicos de AC/DC ("Highway To Hell"), Black Sabbath ("Irom Man"), Van Halen (" Ain't Talkin' About Love"), TheWho ("Baba O'REILY " e "My Generation"), Guns N' Roses ("Sweet Child O Mine")... Calma, ainda não acabou: rola também Scorpions ("Rock You Lke A Hurricane"), Ozzy Osbourne ("Crazy Train"), Rolling Stones ("Satisfaction") e The Doors ("Break On Through").
      "é duro pensar em set lists, porque você tem que estruturar imaginando como as músicas vão ser cantadas uma seguida da outra. Mas ao mesmo tempo, você tem que ser espontâneo, aceitar pedidos e mudar o set num piscar de olhos", explicou o vocalista. "Shout" ( dos Isley Brothers ) é a versãohá mais tempo no repertírio da banda , sempre coladinha com "King For A Day", retirada do disco Nimrod (1997). Foi divulgando este álbum, o quinto do grupo, que o Green Day veio pela ultima vez ao Brasil, em 1998. Naquele ano, a única canção de outro artista cantada era "Knowledge", da banda californiana Operation Ivy. O green Day regravou a música em seu primeiro álbum, 1,039/Smoothed Out Splappy Hours, que saiu em 1990pela mesma Lookout! Records dos homenageados.
     São mudanças esperadas: o filho mais velho de Billie já passa dos 15 anos, idade com a qual o vocalista e guitarrista formou a banda Sweet Dreams, que meses mais tarde daria origem ao Green Day. Daí é natural que hoje exista um bis  quase todo acústico, com "Last Nith On Earth", single atual da banda, "Weke Me Up When September Ends" e "Good Riddance ( Time Of  Your Life)", tocada no fim do show deste que foi lançada, em 1997.

                            PRENDA-ME SE FOR CAPAZ

      Ser um pai de família, no entanto, não pressupõe que ele tenha que terminar o show com todas as peças de roupa roubada, como nos tempos de Dookei, quando chegou até ser preso por ficar nu no palco em Milwaukee, nos Estados Unidos. "Eu fiz isso também no Madison Square Garden, porque não sabia se voltaria a tocar lá de novo. Então eu disse, bem, há uma forma de fazer lembrarem desta ocasião: vou ser o cara que ficou pelado no palco do Madison Square Garden." Desde então, chegou a um ponto em que, em qualquer lugar que toquem, a polícia aparece e começa a dizer; "se esse cara ficar pelado no palco, ele vai ser preso imediatamente".
      Também durante o giro pelos Estados Unidos, a banda deu pistas de como será seu próximo lançamento. Em um show em Denver, Billie anunciou que a apresentação estava sendo gravada. Vem aí um registro ao vivo em DVD e CD. A única inédita prevista não é exatamente uma canção nova. "Cigarettes And Valentines" foi cogitada para ser a faixa-título do sucessor de Warning. O disco, que não foi finalizado, marcaria o retorno do grupo ao som punk do início dos anos 90. A ideia da ópera punk substituiu o processo porque a fita master das gravações foi roubada. Antes de avisar que vem um ao vivo por aí, o vocalista já tinha contado sobre o começo dos trabalhos para mais um álbum de estúdio, ainda sem nome. "Gravamos algumas demos em Berlim. outras em Estocolmo, Grasgow e Amsterdam", confirmou. "Nós queríamos ter as canções como se fossem ainda um rascunho."

                            MINHA DISCOGRAFIA, MINHA VIDA

        Os altos e baixos da discografia do Green Day coincidem com a trajetória de Billie Joe, que define sua vida em estágios. Hoje com 38 anos, elenunca escondeu seu amor pela fase de quando tinha 20 e poucos anos - intervalo que coincide com os três primeiros discos, incluindo o estouro de terceiro, Dookei, lançado quando tinha 22 anos. A virada dos 20 para os 30 teve um gostinho bem bem mais amargo. "Eu era um bêbado. Estava tentando descobrir como ser pai, marido, mas eu ainda queria ter minha vida de punk rock star", lembra. A fase meio perdida, claro, refletiu na produção da banda. Se ba década de 90 o trio despejou cinco discos em lojas, na seguinte foram apenas três. O período após Nimrod (1997) e antes de American Idiot (20040 corresponde ao mais perto que o grupo chegou de entregar os pontos. Põe na canta de Warning (2000) suas vendas abaixo das expectativas ( foram três milhões) e críticas pouco entusiasmadas.
        Embora aquela busca por um caminho mais pop não seja lembrada na hora do show, é errando que se aprende. Afinal, uma das faixas menos punks da retomada de popularidade do grupo, "Boulevard Of Broken Dreams", ainda é a recordista do GreenDay no Hot 100: apareceu no segundo lugar da parada americana.
       Mas será que apostar no esquema da ópera punk duas vezes seguidas não poderia ser visto como um tiro no pé? "O sucesso definitivamente criou uma oportunidade de irmos ainda além",assegura Billie. "Lembro-me que bem antes de 'America Idiot' sair, eu falava tipo 'Cara, eu não sei o que diabos vai acontecer. As pessoas vão pensar que estou louco? Provavelmente um pouco'."Para ele, 21 Century Breakdown vai além da proposta anterior. "Levamos muito tempo para gravar e só queríamos que tudo viesse de um modo natural - todos tinham que ser muito pacientes comigo como compositor." enquanto os hits ( punks ou mansos) continuarem saindo da manga de seu blazer, todo mundo vai continuar bastante paciente.

BILLIE com a família em premiação do canal Nickelodeon, em 2006